Adolescentes catarinenses estavam entre os líderes de uma quadrilha que promovia tortura e incentivava crimes de ódio na internet
Por: Jeane Carla
Santa Catarina foi um dos estados com atuação mais destacada na Operação Adolescência Segura, deflagrada nesta terça-feira (15) pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e de polícias civis de outros sete estados. A ação tem como alvo uma organização criminosa que atuava em ambientes virtuais e aliciava adolescentes para práticas de automutilação, crueldade contra animais, crimes de ódio, pornografia infantil e até tentativa de homicídio.
Ao todo, a operação cumpriu 20 mandados de busca e apreensão, dois de prisão temporária de adultos e sete de internação provisória de adolescentes infratores. Santa Catarina teve papel de destaque: um dos principais investigados, um adolescente de 17 anos, foi apreendido dentro de uma escola em Criciúma. Segundo as investigações, ele fazia parte do núcleo de liderança da quadrilha, ao lado de outros três jovens.
Outro mandado de prisão foi cumprido em Balneário Piçarras, onde foi detido um adulto suspeito de envolvimento com o grupo. A operação mobilizou cerca de 100 agentes e também ocorreu em São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul.

Pagamento para automutilação e transmissão de ataques ao vivo
As investigações revelaram detalhes perturbadores. Os membros do grupo pagavam para que outros jovens se automutilassem diante das câmeras e transmitissem os atos em tempo real. Os conteúdos circulavam em plataformas como Discord e Telegram, com ampla participação de adolescentes que participavam de “desafios” macabros e disputas internas.
Entre os crimes cometidos, estão tentativa de homicídio, armazenamento e divulgação de pornografia infantil, apologia ao nazismo e instigação ao suicídio. Em fevereiro deste ano, um adolescente de 17 anos atirou dois coquetéis molotov em um homem em situação de rua no Rio de Janeiro. A vítima teve 70% do corpo queimado e só recebeu alta hospitalar recentemente. O ataque foi transmitido ao vivo por um soldado do Exército, preso na ocasião, para mais de 200 pessoas em uma sala virtual.
Jovens de perfil escolar e familiar estável
Segundo a Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav-RJ), os adolescentes investigados frequentam a escola, têm estrutura familiar estável e não enfrentam dificuldades financeiras, o que desmistifica a ideia de que o aliciamento online atinge apenas jovens em situação de vulnerabilidade.
Muitos dos investigados têm 18 anos atualmente, mas cometeram os crimes enquanto ainda eram menores. Por isso, responderão conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, com aplicação de medidas socioeducativas. Duas das investigadas são meninas.
Ação articulada e integrada
A operação foi conduzida pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, por meio da Dcav, com apoio do Ciberlab, da Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência (Diopi), e da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). O diretor da Diopi, Rodney da Silva, ressaltou que a ação foi estratégica para desmantelar uma rede altamente estruturada que cooptava adolescentes para o crime.
“Agimos de forma cirúrgica para desarticular uma rede que cooptava jovens para práticas criminosas no ambiente virtual. Nosso objetivo principal é proteger adolescentes e a sociedade de ações que começam no mundo digital e têm consequências graves no mundo real”, afirmou Rodney.
O delegado Cristiano Maia, que também participa das investigações, alertou que quem assiste, incentiva ou compartilha os conteúdos criminosos também pode ser responsabilizado.
“O uso de um apelido ou perfil anônimo não torna ninguém invisível atrás de uma tela”, afirmou.
As investigações continuam, com foco em desarticular completamente a rede e identificar todos os envolvidos. A operação reforça a importância do combate aos crimes virtuais e o papel estratégico que Santa Catarina desempenhou na apuração e execução da ação.